quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Terras longínquas


E ele voltou! De longe vinha, de terras longínquas. Que idioma lá falavam? Ninguém sabia. Que religião professavam? Ninguém conhecia. Que roupa vestiam? Qual sol batia? Quantos casamentos tinha? Ninguém entendia. E quando não se entende, se cria. Mas a sua vizinhança, esta continuava a mesma! Exceto pelo novo remendo na parede, a nova lanchonete na esquina, os pais um pouco mais velhos e as crianças, que até voz já tinham! E a todos queriam que ele reencontrasse – aquele que lhe ensinou o numero oito, aquele que o vendia as torradas quentinhas, aquela que lhe deu aulas no primário, a que rezava por ele na missa e a lista, longe ia. As perguntas eram da cartilha: onde é mesmo que você foi? E você falava a língua deles? E ao reconhecer que pouco mesmo entenderiam, davam a conversa por encerrada:

- Isso mesmo, não é? Temos que fazer o que nos faz feliz.

Os mais aventureiros, querendo se arriscar, perguntavam: “por que você gostou tanto de lá?”. Bem, vale dizer que estas eram as perguntas na superfície. Embaixo das águas, os tubarões tinham novas perguntas: “por que ele é capaz de gostar de algo que não temos aqui?”, “por que ele não quer o que queremos?” e, talvez, em alguns oceanos – “em que ele deseja nos contrariar?”.

Mas um dia ele trocou as palavras: não se lembrava, “quem é você mesmo?”. A sinceridade foi mais forte do que a vontade de agradar. Verdade é que não soube se segurar. E a senhora – esta que rezava por ele na missa – se sentiu ofendida. E na fúria, atacou: “Fiquei velha mesmo, não é? Como alguém novo vai se lembrar de uma velha?”. Lembra-se sim, apesar de não ser aquele um caso. Mas por um instante algo mais desviou sua atenção – preso ao olhar da senhora, ele não pode, senão, tornar-se ela. E confuso estava. Perguntava-se ‘o que era aquilo’ que ele não entendia. E mais, ‘por que não era capaz de aceitar aquilo que não sabia’.

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